sábado, 12 de setembro de 2009

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

A ilha vista do mar


Ver a ilha do ponto de vista do oceano é uma experiência que todos os açorianos deviam poder colocar em prática. O azul do céu e do mar que se mistura com o verde da ilha toma mais significado com uma tal experiência. Sempre me habituei a ver a ilha de um único ângulo, o de terra. Ela oferece uma vida cheia de vivência e experiências, contudo é do lado do mar que se percebe toda a sua capacidade e esplendor.
Deste lado da ilha percebo que ela é maior do que alguma vez poderia imaginar, nunca comparável a um continente, contudo grande para os padrões estabelecidos na minha mente. Lá ao longe consigo perceber que o ilhéu de Vila Franca começa a tomar forma destacada da restante costa. Para lá deste consigo ver, de uma forma ténue, a cordilheira da qual faz parte o Pico da Vara. Como sempre, as nuvens quase impossibilitam o seu visionamento. Há uma neblina que envolve este monstro com que me defronto. Respeito-o mais do que nunca. O mar calmo balanceia este barco e parece-se com um lago. Nele espelham-se as nuvens do céu e o sol quente da manhã que já vai alta. O barco a toda a velocidade dirige-se para o alto mar. A busca de vida marinha é para muitos um meio de subsistência, quer se trate de pesca ou de observação de cetáceos. Neste caso falo da segunda opção. Nunca tinha tido a oportunidade de participar em tal jornada, mas, como diz o ditado, antes tarde que nunca.
Ali ao largo da costa aproxima-se já um grupo de golfinhos. Em gestos de brincadeira aproximam-se de nós, levados pela curiosidade seguem-nos por onde vamos. Lá está um que agora dá um salto acrobático. É o espectáculo natural desta ilha, e nós, qual plateia cheia, aplaudimos e assobiamos em apresso para com este tão belo animal. Só me dou conta de que é um mamífero quando ouço o respirar à tona de água. Se pudesse ser um animal que não o ser humano, quereria poder ser um golfinho. Palmilhar este mar que me rodeia e saltar, e brincar como eles. São os golfinhos o mais sociável dos animais que conheço. Sinto uma simplicidade na suas acções, nos seus movimentos subtis por debaixo do nosso barco. E ora que mais um se exibe para nós. Pergunto-me se eles terão alguma espécie de inteligência que lhes permita tirar alguma conclusão de cada vislumbre que têm sobre a nossa espécie. Gostaria de poder sentir o que eles sentem.
Somos agora avisados de que um grupo de cachalotes fora avistado a algumas milhas da costa, lá para os lados do Faial da Terra. A todo o vapor lá seguimos em busca deste extraordinário ser que habita as nossas águas. Chegados ao ponto de encontro não avistamos nada de relevante. Este é um ser que não gosta muito de confusões. Prefere uma vida mais pacata e silenciosa, talvez seja por isso que passados dez minutos ainda não avistamos nada. É sabido que este magnifico ser habita nos mares dos açores durante todo o ano, é uma espécie natural da região, talvez os maiores açorianos existentes (não apenas no sentido de tamanho). É então que conseguimos ouvir e ver o tão característico respirar desta espécie. Como se fosse um foguete, vemos um enorme jacto de água um pouco mais longe do local onde estamos. Alegria se faz neste barco, tal como os antigos baleeiros que caçavam este animal. Não seremos nós também baleeiros como outros no passado o foram?
Lentamente nos aproximamos mas, este animal não quer nada connosco. Depressa se esconde neste mar. Pouco os consegui vislumbrar. Apenas deu para perceber de que se tratava de uma mãe e da sua cria. Certamente andavam nas suas rotinas. São um animal mais desconfiado; talvez tenham gravados na sua memória hereditária (pura especulação) um sinal que os avisa para a existência de um animal que sem escrúpulos se aproveita deles. Talvez seja por isso que tão depressa fogem da nossa presença.
Daí a pouco somos avisados de que mais uma espécie de baleia anda nas redondezas da costa para os lados da Relva. Apressadamente para lá nos dirigimos em busca de melhor sorte.
Nada! Novamente uma imensidão de mar á nossa frente. Apenas, aqui e ali, como quem nada quer, umas gaivotas voam a escassos centímetros da água. É então que somos surpreendidos com um salto de um baleia. Mais uma explosão de aplausos e assobios arranca cada um de nós dos assentos do barco. Lá está ela! Grita o mestre do barco. E em tom de surpresa somos presenciados com mais uns três ou quatro saltos. Esta baleia que saber o que se passa, a sua curiosidade incita-nos a uma aproximação.
Lentamente, para que ela não se assuste, lá vamos nós.
Vê-se o seu rasto deixado na água. Um animal deste porte deixa as suas marcas bem vincadas neste mar que hoje parece um lago. Subitamente, ali tão perto de nós ela vem respirar á tona de água. Um jacto de água assinala a sua proximidade. Quase que a podemos tocar. Desta vez trata-se de uma baleia-de-bryde, um das muitas subespécies de baleias de barbas – que é o mesmo que dizer que são baleias que se alimentam de pequenos seres – que sazonalmente aqui vêm procriar. São os estrangeiros do mundo das baleias. Apenas cá estão durante alguns meses pois as condições são favoráveis por estas bandas nesta altura do ano.
Este magnifico animal, impulsionado pela curiosidade, aproxima-se de nós a cerca de cinco metros. Posso sentir a sua robustez, embora não se compare com a massiva baleia-azul. Ainda assim é uma animal bem grande para os padrões a que estou habituado. Nunca vira uma animal maior que um elefante de circo que há alguns anos aqui passara. Este magnifico animal, pelo qual me apaixonei imediatamente, transmite-me uma total sensação de paz. Com gestos subtis, desloca-se por estas águas. Vira-se de barriga para cima, como que a convidar a uma carícia, como fazem os gatos e os cães. Mas este animal não é propriamente um gato ou um cão. Não se pode chegar-lhe e fazer-se-lhe umas festinhas. É pena pois gostaria de poder sentir a sua pele; poder com os meus dedos sentir a vida deste “monstro” dos mares.
Com mais umas voltas e reviravoltas lá deixamos o animal ficar. É hora de voltar. O espectáculo por agora acabou. Fecha-se o pano, arrumam-se a cadeiras e toca a zarpar para terra firme que já se faz tempo.
A ilha, agora sob um sol escaldante, chama por nós. E nós, obedientes, lá vamos. Na verdade é a barriga que já está a dar horas. Já marchava bem um almocinho.
Outros dias como este virão. Mais segredos se revelarão vindos das profundezas deste mar e eu, se o PAI me permitir, cá estarei para os conhecer.


Miguel Teixeira de Andrade